O texto de hoje vai continuar a série sobre o desenvolvimento neuropsicomotor dos bebês. Vamos sair um pouquinho da ordem cronológica devido a solicitações dos nossos leitores e clientes, e abordar um tema que gera bastante dúvidas: o uso do andador. Existe algum benefício? Prejudica o desenvolvimento do bebê? É arriscado? Quais os tipos que existem?

É incrível, quando se fala na criação dos bebês, quantas vezes surge aquela velha e conhecida frase: “usei e não tive problema, estou vivo”. E com esse polêmico “brinquedo” não é diferente. Porém, antes de continuar, precisamos explicar que, atualmente, existem 2 tipos de andadores: os convencionais, que as crianças ficam suspensas pela virilha, e os modernos, que não sustentam o peso da criança, e servem para empurrar.

Andadores convencionais:
Aparentemente inofensivo, apresenta diversos riscos para o bebê, e nenhum benefício para ele, como vamos explicar ao longo do texto. O único “benefício” deles, segundo os pais, é a independência da criança, que fica entretida, e consequentemente fornece um “descanso” para eles. Esse “benefício”, é o que gera o maior risco para os bebês, vamos entender o motivo?
Acidentes domésticos
Normalmente, os bebês são colocados no andador entre 6 a 9 meses de idade. Nesta idade, a curiosidade deles está bastante aguçada, e oferecemos, enquanto estão no andador, uma altura maior do que se estivessem sentados ou engatinhando. Deste modo, facilitamos que possam puxar toalhas de mesa, derrubando itens sobre eles e se acidentando, bem como alcancem objetos em cômodas, inadequados para sua idade, que também podem causar ferimentos graves. Além disso, a velocidade desenvolvida pelo bebê no andador, apesar de parecer inofensiva, facilita que o mesmo tombe, caso haja objetos pelo chão, degraus e escadas, e sem condições de se proteger, o bebê acaba batendo a cabeça no chão, gerando traumatismos cranioencefálicos que variam de leve a grave. Em locais que possuem fontes ou piscinas, qualquer descuido também pode gerar uma queda na água, e o risco de afogamento. Por estes motivos, com casos graves que culminaram com a morte dos bebês, alguns países passaram a proibir a comercialização deste tipo de andador. Então, acredito que este motivo já seja suficiente para abandonar a ideia de colocar seu filho num andador convencional, mas continuaremos explorando os outros prejuízos dele, caso ainda não esteja convencido.
Mudanças da biomecânica do corpo

Quando andamos, descarregamos o nosso peso sobre os membros inferiores, e nosso apoio é nos pés. No andador, o bebê fica apoiado na virilha, o que não é nada fisiológico. Se ele tem força adequada para andar, deve ser capaz de sustentar seu peso sobre os pés, e não precisar ser sustentado na região genital.
O assento do andador, no qual o bebê fica apoiado, não tem altura regulável. Desta forma, na maioria dos casos, ou ele gera um apoio inadequado dos pés do bebê no chão, que muitas vezes se locomove na ponta dos pés, ou faz com que o bebê se empurre com os 2 joelhos flexionados.
O equilíbrio do tronco deixa de ser trabalhado, pois o andador impede que o bebê o faça. Além disso, as reações de proteção de queda ao solo também não se desenvolve, devido ao excesso de “estabilidade” oferecida pelo andador e a impossibilidade de se proteger com as mãos no solo. O bebê vai se empurrando com o andador, e isso prejudica a aquisição da noção de distância e do momento de frear (parar).
Os movimentos dos braços ficam limitados devido à presença da bandeja que compõe o andador. E a possibilidade de manipular os objetos com as mãos também, pois o bebê não tem como atirar o brinquedo, recuperá-lo, sacudir, testar os ruídos que fazem, pois alcançá-los com a presença da bandeja é quase impossível.
Pulando etapas sem acelerar o desenvolvimento

Quando deixamos as crianças livres no solo, favorecemos que as mesmas se movam, testem possibilidades, alonguem e fortaleçam os seus músculos. Não precisamos “ensinar” os bebês a rolar, sentar ou andar, pois na tentativa de explorar o ambiente e os brinquedos, os mesmos vão descobrindo as formas adequadas para se movimentar e mudar de posturas. Se retiramos o bebê do solo, e colocamos no andador, não permitimos que ele se arraste, engatinhe, agache, levante se segurando nos móveis, e ele perde a oportunidade de testar e aprender a usar o seu corpo. Enquanto está no andador, o bebê está “preso”, de forma que, se o brinquedo cai no chão, ele não pode agachar para pegar, e se quer sair do andador, não tem como fazê-lo sozinho. Se observarmos um bebê brincando de forma livre, podemos perceber quantas mudanças de postura ele realiza, não permanece muito tempo igual, está trocando sua posição durante todo o tempo. Isso é impossível de acontecer no andador.
Todo o neurodesenvolvimento infantil ocorre de forma sequencial, onde uma aquisição prepara o bebê para a aquisição seguinte. Sustentam o pescoço, rolam, arrastam, se colocam de gato, engatinham, se puxam, se colocam de pé, andam lateralmente. O andar de lado, se segurando nos móveis, faz com que o bebê transfira o peso entre as pernas, desloque o corpo, o centro de gravidade, mova as pernas. Ela prepara o bebê, para que, quando se sentir seguro, se solte dos móveis e comece a trocar passos de forma independente.

Por fim, como esperado, nenhum estudo demonstrou que o uso do andador favorece que a criança ande de forma independente, mais precocemente. Ao contrário, mostram que as crianças atrasam a marcha, pois ficam dependentes da estabilidade fornecida por este aparato, além das outras desvantagens citadas acima.
Todos esses tópicos abordados para os andadores convencionais também são estendidos para outros aparatos que sustentam a criança pela virilha, ou pelas axilas.
Os andadores modernos

Desde que sejam utilizados quando a criança o busca, e já tem condições de se colocar de pé, segurar e empurrar o mesmo, não gera pulo de etapas, e não são prejudiciais ao desenvolvimento. Porém, a criança precisa ter o interesse de usá-lo, pois irá testar e ajustar o seu equilíbrio para empurrá-lo sem cair, com força graduada.
Os bebês enquanto protagonistas do seu desenvolvimento
Até aprenderem a andar sozinhos, outros aspectos, além do motor, são trabalhados. A visão, a cognição, autoestima, confiança, os sentimentos, vão, a longo prazo, influenciar na linguagem, leitura, atenção e aprendizado global.
Portanto, o que precisamos é oferecer para as nossas crianças autonomia, oportunidade de se movimentar, ter experiências sensoriais, se construir e reconstruir a partir das suas próprias experiências, de forma ativa e independente. Sem pressionar, sem acelerar, sem pular etapas, nosso papel é apoiar e acolher seus desejos, investigações e descobertas.
Em casos de bebês com risco para atraso de desenvolvimento, síndromes, prematuridade e alterações do sistema nervoso central, pode ser necessário estímulo diferenciado orientado e realizado por profissional capacitado, fisioterapeuta ou terapeuta ocupacional, e algumas aquisições citadas no texto podem não ocorrer ou não se aplicar.

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Caroline Burgos
caroline@amama.com.br